Por muito tempo, em todos os segmentos, o marketing foi visto apenas como suporte às vendas
— e não como uma ferramenta estratégica para diferenciação e construção de desejo. No
mercado imobiliário, não era diferente. Por ser um setor historicamente menos competitivo,
onde a publicidade tradicional não exigia tanta inovação, o pensamento predominante era: “Se
o projeto for bom, vai vender”. E funcionava assim: a técnica bastava para diferenciar.
Como tantos outros millennials de classe média, desde muito nova vi meus pais trabalharem e
investirem, prioritariamente, em terrenos e imóveis, na esperança de garantirem um futuro
estável para mim e para o meu irmão. Visitar terrenos, acompanhar obras e analisar plantas
estão entre as minhas primeiras – e melhores memórias de infância.
Com 9 anos, morando na Barra da Tijuca, eu já era capaz de reconhecer e apontar o logotipo de
construtoras em cima das tantas gruas espalhadas pelo bairro. Adorava pegar os panfletos
publicitários no sinal e observar as plantas dos apartamentos. Lembro-me das campanhas que
mostravam famílias americanizadas e uma abordagem superficial, sem estratégia de persuasão
e que não considerava a real jornada do cliente.
O erro mais comum no marketing imobiliário tradicional era enxergar o imóvel com o olhar do
engenheiro, apenas como um produto de concreto e tijolos — e esse erro, eu jamais cometeria.
Em 2013, eu já cursava Publicidade e atuava em uma das maiores agências especializadas em
mercado imobiliário do Rio de Janeiro. Naquela época, o avanço da tecnologia já havia
praticamente nivelado o jogo entre as construtoras. E, diante disso, o marketing passou a ser
valorizado. Lembro-me de uma corrida desenfreada para incluir e comunicar mais atributos do
que a concorrência, a qualquer custo. Com o mercado aquecido, os investimentos em materiais
impressos, estandes e premiações eram enormes — e na minha opinião, um pouco
desesperados.
Atores e atrizes famosos estrelavam as campanhas, os lançamentos apareciam no horário nobre
da televisão e os profissionais de marketing, enfim, ocuparam cadeiras estratégicas onde antes
só se viam engenheiros. Esse movimento trouxe mais sinergia entre quem criava as peças e
quem comprava. Foi o primeiro passo para gerar conexão entre a comunicação e a experiência
do cliente.
Depois de ter atuado em agências, passei para a cadeira de marketing e trabalhei com mercado
imobiliário até receber uma proposta para me mudar para São Paulo. Na época, o setor
enfrentava uma dura crise, e estrategicamente optei pela oportunidade de assumir um cargo de
gestão em uma fintech. Tudo corria bem na “terra da bolacha” e a minha carreira estava em
ascensão, até que em 2021 recebi uma proposta para voltar ao mercado imobiliário — dessa
vez, em Niterói.
A Soter, empresa com mais de meio século e líder de mercado na cidade, buscava se modernizar.
Isso soava como música para os meus ouvidos. Agora, como gestora, esse olhar mais
humanizado e atento às emoções poderia, finalmente, guiar o marketing imobiliário que eu
sempre acreditei.
Lembro-me como se fosse ontem das minhas primeiras orientações para a equipe: “Estão
vetadas chaves reluzentes apontadas para a câmera, caixas de mudança e frases genéricas como
‘O seu novo lar espera por você’”.
O desenvolvimento de um novo produto deve considerar os hábitos de consumo, as aspirações
do público, o cenário econômico, o nível de saturação do mercado — e, principalmente, a
inspiração que vai orientar sua conceituação.
Para mim, as campanhas mais eficazes passam longe de uma simples lista de diferenciais
técnicos. Elas constroem uma narrativa envolvente desde o início. O foco precisa estar em como
aquele imóvel se encaixa na vida do cliente, nas emoções que ele vai sentir ali e nas
oportunidades que aquele espaço pode criar.
Esse exercício começa antes mesmo de o produto existir por completo. Ele acontece no papel,
na planta, nos primeiros esboços. O marketing precisa mergulhar no projeto, participar da
concepção, identificar personas, antecipar cenários e contribuir ativamente para a diferenciação
do produto — para só então comunicar.
Esse processo, ainda raro entre construtoras, tem feito toda a diferença. Acredito que ele seja
um dos fatores que contribuiu para os resultados que alcançamos: nesses últimos quatro anos,
vendemos 94% de tudo o que lançamos, somando mais de R$ 1 bilhão em VGV.
Atualmente, quando um cliente é direcionado para a sala de reunião, deixamos em cima da
mesa um sonho de padaria com os dizeres: “Nada é tão doce quanto a realização de um sonho.”
E a conexão genuína começa ali, no detalhe.
Desde o estande — que agora conta com espaço kids — até a comunicação que entregamos nas
ruas, tudo é pensado para gerar experiência. O marketing precisa conversar com a sociedade e
estar a serviço do cliente.
Com as últimas orientações da OMS, por exemplo, decidimos investir em um livro infantil de
atividades e em painéis montessorianos. Assim, afastamos as telas dos espaços infantis do nosso
estande, respeitando a saúde e o desenvolvimento das crianças.
Mesmo sabendo que 80% dos consumidores têm mais probabilidade de fechar com uma marca
que oferece uma experiência personalizada, ainda me perguntam se não tenho receio de inovar
em um mercado que preza pela tradição. Também é comum questionarem se eu não tenho
medo de expor alguns “pontos delicados” nas peças publicitárias — como uma avó com
Alzheimer, como retratamos no filme-conceito do Íon Icaraí — eu respondo:
“Tenho medo é de concretar a vida.”
Porque vender imóveis na planta não é sobre metros quadrados. É sobre futuro, sonhos e
expectativas. E nisso, todo afeto cabe.
Paula Lavor
Paula Lavor é publicitária com mais de 10 anos de experiência em branding e estratégias de marketing.
Atualmente é gerente de marketing na Soter Engenharia, onde desenvolve produtos de alto padrão, reconhecidos
pelo valor estético, pela coerência conceitual e por fortalecer a relação com o cliente, contribuindo para a
diferenciação e rentabilidade da empresa.