No Brasil, 79% das pessoas com mais de 16 anos admitem tomar medicamentos sem prescrição médica ou farmacêutica. Os dados são da pesquisa feita pelo Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade (ICTQ), em 2018. Hábito comum para os brasileiros, a automedicação pode ser bastante prejudicial, como explica a farmacêutica e professora da UNIFACS, Isleide Santos.
Ela acredita que essa cultura da automedicação se deve à dificuldade de acesso a profissionais de saúde, o que influenciaria na busca de tratamento por conta própria. “No sistema público, às vezes, você demora três ou quatro meses para conseguir uma consulta e a doença não espera isso tudo”, comenta.
Isleide lembra que uma consequência do uso indiscriminado de antibióticos é a resistência medicamentosa. “Bactérias vão criando resistência e se tornam mais difíceis de se combater. O antibiótico, por exemplo, acaba perdendo o efeito e o paciente precisa de remédios cada vez mais potentes”, explica. Por conta disso, em 2010, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a exigir a retenção de receita para venda de antibióticos no país.
Liberado, mas nem tanto
Não são apenas os antibióticos que oferecem riscos. Na maioria das farmácias, é comum medicamentos ficarem expostos nas prateleiras ao alcance dos clientes, como vitaminas, antigripais e outros. Isleide acredita que essa prática também contribui para a automedicação. Ela frisa: mesmo esses medicamentos podem apresentar riscos. “No Brasil, a Dipirona é liberada. Ela fica exposta para comprarmos sem critério. Nos EUA, ela é proibida porque pode provocar câncer. Seu uso deveria ser apenas com avaliação médica”, determina.
O Paracetamol é outro exemplo de medicamento que deve ser usado com cautela. “Quando chega no fígado, ele é transformado em outra substância. Pacientes com problemas hepáticos, por exemplo, podem sofrer consequências. Muitas pessoas não sabem disso. Falta informação ao público”, afirma.
Associações perigosas
O paciente que já faz uso de algum medicamento, ao ingerir outro, sem indicação do médico, pode sofrer de interação medicamentosa. “A substância pode diminuir ou inibir o efeito do medicamento que o paciente já faz uso”, afirma a farmacêutica.
Para ela, uma das grandes preocupações, atualmente, são aqueles que se automedicam para emagrecimento. “Muitos usam certas substâncias porque outras pessoas utilizaram e deu certo, mas o efeito não é o mesmo para todo mundo e seu uso indiscriminado pode desencadear vários problemas de saúde”, ressalta Isleide.
Natural pode?
Outro ponto sobre esse tema que Isleide considera importante são os fitoterápicos, remédios à base de plantas. “As pessoas acham que por ser planta, não pode causar mal. Mas o boldo, por exemplo, é abortivo e muitos não sabem. A canela, também, mas em menor proporção”, revela. “O mesmo acontece com a passiflora. O paciente pode ter uma hipotensão, ou seja, ficar com a pressão muito baixa”, acrescenta.
Hepatite medicamentosa
Há ainda um outro risco relacionado a altas dosagens de medicamento: a hepatite medicamentosa. A doença pode ser desenvolvida por pessoas que utilizam muito um medicamento, mesmo com prescrição médica. “Acontece normalmente com pacientes que precisam fazer um tratamento longo para doenças como depressão ou câncer. O medicamento é necessário para o tratamento, mas pode acarretar hepatite medicamentosa”, afirma a farmacêutica.
Isso ocorre segundo Isleide, porque certas substâncias são agressivas para o fígado, primeiro órgão a ser afetado. Porém, há a possibilidade de reverter o quadro. “Com o tempo, o próprio fígado pode se regenerar, a partir da desintoxicação das substâncias’, diz.