A identidade de gênero, especialmente quando associada a figuras femininas públicas, segue sendo alvo de especulações que, por mais absurdas que pareçam, carregam camadas de preconceito. Em diferentes momentos, celebridades mulheres foram acusadas falsamente de serem trans, não como reconhecimento, mas como tentativa de difamação. Esses episódios, quase sempre embalados como “curiosidade” ou “teoria”, revelam como a sociedade ainda usa a identidade trans como ferramenta de ataque, reforçando estereótipos e padrões estreitos de feminilidade.
Lady Gaga foi uma das primeiras celebridades pop a enfrentar rumores infundados de que seria uma mulher trans. No final dos anos 2000, fotos e vídeos distorcidos alimentaram teorias conspiratórias de que ela seria intersexo ou teria nascido homem. Em 2010, aos 24 anos, respondeu com ironia: “Mesmo que eu fosse hermafrodita, qual seria o problema?”. Ao rejeitar o constrangimento e não alimentar o sensacionalismo, Gaga deu o tom: ser confundida com uma pessoa trans não deveria ser ofensivo.
Brigitte Macron enfrentou em 2021 uma onda de desinformação ainda mais agressiva. Aos 68 anos na época, a primeira-dama da França foi alvo de uma teoria conspiratória que afirmava que ela teria nascido homem, sob o nome de Jean-Michel Trogneux. O boato, sem qualquer fundamento, viralizou em redes sociais e levou Brigitte a processar os responsáveis. O episódio evidenciou como a identidade de gênero segue sendo usada para tentar descredibilizar mulheres públicas.
Michelle Obama também já foi alvo de rumores semelhantes durante e após os mandatos de Barack Obama. Aos 60 anos, a ex-primeira-dama jamais comentou diretamente as especulações, mas analistas apontaram o caráter racista e sexista por trás das montagens que circularam nas redes, insinuando que ela teria traços masculinos demais. A narrativa sustentava a ideia de que força, influência e presença não combinam com feminilidade.
Serena Williams, considerada uma das maiores atletas da história, passou a carreira sendo alvo de comentários que questionavam sua aparência, sua força física e até sua identidade de gênero. Aos 42 anos, ela já declarou diversas vezes o cansaço de ter sua feminilidade constantemente colocada à prova, como se não fosse possível ser forte e mulher ao mesmo tempo. Os boatos, mesmo quando implícitos, revelam uma tentativa contínua de desumanização da mulher que não se encaixa nos moldes frágeis da delicadeza esperada.
Para a influenciadora brasileira Suellen Carey, 37 anos, que vive no Reino Unido e é conhecida pelo conteúdo humorístico com foco em identidade de gênero, esses boatos dizem muito sobre a estrutura social. “Quando espalham esse tipo de rumor, o recado é claro: se você é uma mulher forte, pública, inteligente ou poderosa demais, vão tentar invalidar isso. E, na cabeça de muita gente, a pior forma de invalidar uma mulher é dizendo que ela é trans.”
Suellen destaca que o problema não é ser trans, mas o peso negativo que ainda se coloca nessa identidade. “É sempre usado como tentativa de constrangimento. Como se fosse vergonhoso. Como se a mulher trans fosse o oposto da mulher de verdade. É aí que está o preconceito: não no boato, mas na reação que ele provoca.” Conclui.