Mais de um mês após o acidente, família cobra justiça e denuncia sensação de impunidade: “Arthur foi atropelado duas vezes, pela violência e pelo sistema”
Mais de um mês após a morte do policial militar Arthur Luiz Santos Coelho, de 41 anos, familiares ainda buscam respostas e justiça. No dia 25 de maio, Arthur pilotava sua motocicleta pela rodovia SP-75, em Itu, interior de São Paulo, quando foi atingido violentamente por um carro conduzido por um motorista embriagado. Ele permaneceu internado por três dias em estado gravíssimo, mas não resistiu aos ferimentos e faleceu em um hospital de Sorocaba.
Desde então, a esposa do policial, Camilla Matos Dias Coelho, de 35 anos, vive o luto e a indignação com a condução do caso. “Meu marido foi atropelado duas vezes: a primeira pelo carro, a segunda pela Justiça”, afirma.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP), o motorista, de 26 anos, foi preso em flagrante. O teste do bafômetro confirmou a ingestão de álcool. Arthur seguia na motocicleta quando foi atingido por trás pelo veículo. Após exames médicos, o motorista foi conduzido à delegacia.
Inicialmente registrado como embriaguez ao volante com lesão corporal culposa, o caso teve a tipificação alterada para homicídio culposo na direção de veículo automotor, após o óbito. No entanto, o condutor foi liberado mediante pagamento de fiança — o que gerou revolta na família.
“Enquanto meu marido lutava pela vida, o motorista já estava em casa, com os seus. E agora, mesmo com o Arthur morto, ele segue livre. Isso é justiça?”, questiona Camilla.
Gravidade e abandono
Arthur chegou a ser levado à Santa Casa de Itu, mas diante da gravidade dos ferimentos, foi transferido ao Hospital Regional de Sorocaba, onde entrou em coma profundo.
“Os médicos foram claros: se ele abrisse os olhos, já seria um milagre. Mesmo que vivesse, os prognósticos eram de estado vegetativo, dependência total, perda de consciência”, relata a viúva.
Camilla, que enfrenta a remissão de um câncer gestacional, agora lida com a ausência do companheiro, pai de seus dois filhos: Theodoro, de 4 anos, autista nível 2 e não verbal, e Murilo, de 2 anos. “Arthur era nosso alicerce. Participava de tudo, nunca deixou de estar presente em uma consulta, uma terapia, um momento sequer com os filhos.”
Além de policial da 1ª Companhia do 50º Batalhão da Polícia Militar do Interior, Arthur era atleta, praticava trilhas, organizava encontros com amigos e realizava trabalhos extras de segurança para complementar a renda da família. “Ele saiu de casa para proteger a sociedade. Morreu sem ser protegido por ela. O Estado falhou com ele, e falhou com a gente”, desabafa.
Desigualdade e questionamentos
Camilla também critica o que considera um tratamento desigual da Justiça. “E se fosse o Arthur quem estivesse bêbado e tivesse atropelado alguém? Estaria solto após pagar fiança? Ou seria apontado como ‘o policial que matou um pai de família?’ Ele estaria preso, com certeza. Mas quando é o contrário, não há essa indignação. Por quê?”
A família aguarda a conclusão do inquérito policial, que depende de laudos periciais ainda em andamento. A espera prolonga a dor e alimenta a sensação de impunidade. “Vivemos num país onde a vida humana tem preço, onde o criminoso paga e vai embora, enquanto a vítima vira estatística. As pessoas continuam bebendo e dirigindo porque sabem que a punição é leve. Mas e quem fica? Como eu explico para os meus filhos que o pai deles nunca mais vai voltar?”
Decisão judicial
Procurado, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou que a audiência de custódia foi realizada no dia do acidente, 25 de maio de 2025. Na ocasião, o suspeito recebeu liberdade provisória mediante pagamento de fiança de R$ 5 mil, além de cumprimento de medidas cautelares: comparecimento mensal ao fórum, proibição de frequentar bares e casas noturnas, não se ausentar da comarca por mais de oito dias sem autorização judicial, recolhimento domiciliar noturno e aos fins de semana, além da suspensão do direito de dirigir.
Camilla reforça que sua luta não é por vingança, mas por justiça. “Milhares vieram antes do Arthur. Centenas vieram depois. E nada muda. Mas eu vou continuar falando, porque isso não pode ser normal. Isso não pode continuar acontecendo. ”