Com a chegada das Big Techs como Uber, Ifood, Rappi, entre outras, a sociedade se adapta às novas formas de prestação de serviços, modificando a sua forma de consumir e entendendo as relações de trabalho que surgem neste novo contexto.
Desde então há discussões sobre a forma como os trabalhadores que exercem a atividade fim (motoristas/entregadores) se vinculam às plataformas tecnológicas de intermediação de serviços.
Estas discussões foram levadas à Justiça do Trabalho e nos deparamos com decisões que reconhecem a existência de um vínculo de emprego formalizado e outras que não reconhecem.
Com o intuito de regular a situação desses trabalhadores, esta semana, o Senador Rogério Marinho apresentou proposta de Lei Complementar que “estabelece direitos para a melhoria das condições de exercício das atividades dos prestadores de serviços independentes de transporte remunerado privado individual de passageiros ou serviço remunerado de entregas, cria mecanismos de inclusão previdenciária e disciplina a relação jurídica entre esses prestadores e as operadoras de plataformas tecnológicas de intermediação”.
Logo no início do projeto, o artigo 3º diz que a relação que se estabelecerá entre a plataforma e o prestador de serviços será de natureza civil, afastando a relação de emprego e, portanto, a aplicação da Consolidação das Leis Trabalhistas.
O projeto determina que o prestador de serviços age de forma livre, escolhe os dias e horários de trabalho, não deve exclusividade à plataforma e pode se vincular a quaisquer outras atividades profissionais. Por outro lado, destaca que a imposição de normas de conduta, políticas, regras de uso da plataforma, o uso de sistemas de acompanhamento real da execução dos serviços, a oferta de cursos e treinamentos e o oferecimento de benefícios e incentivos de qualquer natureza aos prestadores de serviços não descaracteriza a natureza civil da relação.
Dispõe, ainda, que ao formalizar a relação, no contrato ou termo celebrado, devem constar as regras para a prestação dos serviços, incluindo as hipóteses de bloqueio, suspensão ou exclusão da conta do prestador na plataforma digital.
A proposta impõe direitos e obrigações a ambas as partes e traz regras para a exclusão do prestador de serviços da plataforma, que deve ser feita de forma justificada.
Entre outros pontos, o projeto determina que as plataformas forneçam espaços de apoio destinados aos prestadores de serviços com estrutura para instalações sanitárias e lavatório, ambiente para refeições, água potável, descanso e acesso à internet; contratem seguro de vida e para a reparação de danos; permite que as plataformas forneçam auxílios de qualquer natureza a seu critério; determina que estas orientem os prestadores de serviço sobre medidas de prevenção de acidentes de trânsito.
Por fim, o projeto determina a inclusão dos “prestadores de serviços independentes” no Regime da Previdência Social, como contribuinte segurado obrigatório, na categoria de contribuinte individual. Determina que seja recolhida a alíquota de 11% por cada uma das partes – plataforma e prestador de serviços.
As relações sociais mudam, novas tecnologias são introduzidas no dia a dia, a forma de consumir muda, e a legislação não é capaz de acompanhar essas transformações na velocidade com que elas acontecem.
A regulamentação das relações de trabalho entre os motoristas/entregadores e as plataformas de intermediação é medida urgente e precisa ser discutida – temos um problema de saúde pública, considerando as condições de trabalho e os diversos acidentes que têm acontecido atualmente.
Esperamos que os próximos passos em torno do projeto e das discussões sobre o assunto passem a caminhar de forma mais acelerada, tendo em vista que é necessário que tais trabalhadores tenham melhores condições de trabalho, benefícios e estejam dentro do regime de previdência social.
*Tatiana Bhering Roxo é Mestre em Direito do Trabalho e pesquisadora do Legal Grounds Institute.