A Miastenia Gravis é uma doença autoimune causada por anticorpos que agem contra componentes da comunicação natural entre nervos e músculos – junção neuromuscular – e caracterizada por fraqueza muscular flutuante e fadiga de diferentes grupos musculares do corpo. Por ser uma doença rara e de difícil diagnóstico, a Miastenia Gravis é, geralmente, associada a outras doenças autoimunes, cujos sintomas, muitas vezes, podem se confundir.
“A doença autoimune se dá pelo mau funcionamento do sistema imunológico, onde o organismo produz anticorpos contra ele mesmo e ataca órgãos e tecidos do próprio corpo, como músculos, articulações, pele, células, nervos, pulmões, tireoide. Características clínicas, como fraqueza neuromuscular e sinais oculares causam confusão diagnóstica entre duas patologias”, explica o Dr. Eduardo Estephan, médico neurologista e diretor científico da Abrami (Associação Brasileira de Miastenia).
Para termos uma ideia, a prevalência de Miastenia Gravis no mundo muda conforme a localização geográfica, sendo que a taxa de incidência anual varia de 0,25 a 20 por 1.000.000 de habitantes. O início da doença ocorre entre os 20-40 anos de idade e as mulheres representam 60% desse grupo.
A doença da tireoide é a doença autoimune mais comum associada à Miastenia Gravis, com uma prevalência de 5 a 10%, enquanto a Miastenia Gravis está presente em 0,2% dos pacientes com doença autoimune da tireoide diagnosticada.
Ainda de acordo com o especialista, as doenças autoimunes da tireoide são frequentemente acompanhadas por Miastenia Gravis de início precoce e tardio, sendo que a miastenia coexistindo com doenças autoimunes da tireoide segue um curso mais brando do que a Miastenia Gravis sozinha.
Publicado na revista científica Brain and Behavior e reproduzido pela US National Library of Medicine, o estudo realizado por cientistas de Taiwan e denominado “Prevalence and impact of autoimmune thyroid disease on myasthenia gravis course”, – traduzido para o português como “Prevalência e Impacto de doenças autoimunes da tireoide no curso da Miastenia Gravis” – reuniu 343 pacientes consecutivos com Miastenia Gravis, entre 4 e 89 anos de idade, e mediu a prevalência de doenças autoimunes em um estudo transversal. As concentrações de anticorpos antitireoideanos, ou seja, que atacam a tireoide foram medidas em todos os pacientes e os pesquisadores avaliaram o curso clínico da Miastenia Gravis, o tratamento e os seus resultados.
A pesquisa mostrou que as doenças autoimunes da tireoide foram diagnosticadas em 26,8% dos pacientes com Miastenia Gravis, incluindo 4,4% com Doença de Graves (GD), 9% com tireoidite de Hashimoto (HT) e 13,4% apenas com anticorpos antitireoidianos. Os resultados concluem que a terapia imunossupressora foi necessária com menos frequência nos pacientes com Miastenia Gravis e Doenças Autoimunes da Tireoide, indicando indiretamente um curso mais leve das doenças.
Esse mesmo estudo mostrou ainda uma maior prevalência de doenças pré-existentes da tireoide e uma maior probabilidade cumulativa dessas doenças após o diagnóstico de Miastenia Gravis do que na população em geral.
Doença de Graves x Tireoidite de Hashimoto
A Doença de Graves (DG) é uma doença da tireoide caracterizada pelo excesso de hormônios dessa glândula no corpo, causando hipertireoidismo. A DG acomete mais mulheres do que homens, principalmente entre os 20 e os 50 anos, apesar de poder surgir em qualquer idade. Em pacientes não miastênicos, a doença pode ser bem controlada com o uso de remédios, terapias com iodo radioativo ou com a cirurgia de tireoide. Entre os sintomas que se confundem com a Miastenia Gravis estão fraqueza muscular e alterações nos olhos, como olhos salientes, coceira, lacrimejo e visão dupla.
A tireoidite de Hashimoto tem como principal característica a inflamação da tireoide causada por um erro do sistema imunológico. Nesse caso, o organismo fabrica anticorpos contra as células da tireoide, provocando a destruição da glândula ou a redução da sua atividade, o que pode levar ao hipotireoidismo por carência na produção dos hormônios T3 e T4. Cansaço, sonolência e reflexos mais vagarosos são alguns dos sintomas que podem se confundir com os da Miastenia Gravis, embora a maior incidência de doenças autoimunes da tireoide ligadas à Miastenia Gravis seja de Doença de Graves.
É importante ressaltar que a doença aguda e o uso de corticosteroides afetam a função tireoidiana, mas, ao mesmo tempo, os corticosteroides (cortisona) têm efeito positivo devido à sua função imunorregulatória.
“O tratamento de miastênicos com doenças autoimunes da tireoide associadas exige acompanhamento médico constante, de preferência, com um especialista em miastenia para avaliar as melhores combinações medicamentosas e a evolução do curso da doença. Esse acompanhamento permitirá um melhor equilíbrio entre as patologias e, consequentemente, mais qualidade de vida”, finaliza Estephan.
Fonte: Dr. Eduardo Estephan
Neurologista do Ambulatório de Miastenia do Hospital das Clínicas (SP), do Ambulatório de doenças neuromusculares do Hospital Santa Marcelina (SP) e do Centro de Cérebro e Coluna (São José do Rio Preto). Atualmente, diretor científico da ABRAMI (Associação Brasileira de Miastenia).