As longas filas em Manaus para a compra desesperada de cilindros de oxigênio e as cenas de pessoas sofrendo pela falta deste insumo demonstraram de forma dramática a importância de uma gestão eficiente do uso deste equipamento no dia a dia das unidades de saúde. Neste sentido, soluções desenvolvidas com base na Internet das Coisas (IoT) começam a ser usadas como forma de acompanhar em tempo real o ritmo de esvaziamento e prover a reposição em tempo hábil para manter o tratamento nos volumes determinados pelos médicos de forma ininterrupta.
Um desses casos é o dispositivo ATAS O2, que já tem o primeiro lote de aproximadamente 1.300 unidades em fase de desenvolvimento. A solução foi criada com o uso da tecnologia Sigfox, por meio de uma parceria entre o CESAR, um dos maiores centros de inovação do país, e a Salvus, startup especializada em tecnologias emergentes para a área de saúde. Por meio de um dispositivo acoplado nos cilindros, os sensores conseguem monitorar como está o fluxo de oxigênio e obter as respostas desejadas. A tecnologia escolhida para a conexão dos dispositivos foi a Sigfox, fornecida pela WND – operadora que provê a tecnologia no Brasil. A rede operada pela WND com a tecnologia Sigfox é exclusiva para IoT com ampla cobertura no território nacional, tendo hoje mais de 150 milhões de mensagens trafegadas por mês.
A gerente de negócios do CESAR, Karina de Sá Spinelli, explica que antes mesmo da pandemia, a falta de uma medição precisa da situação dos cilindros já era um problema grave para pessoas e empresas de saúde. Ela argumenta que muitas vezes, pela falta de controle sobre os volumes ainda à disposição, os cuidadores dos pacientes em home care, por exemplo, acabam solicitando a reposição dos cilindros com urgência, já que muitas vezes só é possível detectar o esvaziamento quando o produto já não está mais à disposição. Nestes casos, as empresas que fornecem os cilindros trabalham com um custo logístico muito elevado devido à dificuldade em planejar rotas de entrega mais eficientes.
“Parece um problema de menor importância quando avaliado sob a perspectiva de caso a caso, mas a pandemia está mostrando que prescindir do controle baseado em dados em todos os detalhes pode acabar se transformando em uma crise de saúde pública de grandes proporções. Esta solução já existe no caso dos cilindros de oxigênio, mas pode servir de inspiração para outras aplicações”, diz.
Além da conhecida utilização no tratamento de pessoas infectadas pelo Covid-19, a utilização do oxigênio medicinal ocorre em pacientes acometidos principalmente pela DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica) que de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) afeta mais de 210 milhões de pessoas no mundo.
No Brasil, dados da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia apontam que mais de 6 milhões de pessoas possuem a doença, sendo que apenas 18% foram diagnosticadas e seguem de alguma forma o tratamento.
A DPOC é o quarto motivo em internações nos sistemas públicos do país e a terceira causa de mortes no mundo. Segundo relatório do Gold COPD, somando apenas os custos diretos e indiretos, da União Europeia e Estados Unidos, essa doença tem um impacto financeiro de mais de U$85 bilhões de dólares. Em 2018 o SUS registrou mais de 110 mil internações emergenciais, motivadas principalmente pelo não tratamento e reabilitação, com um custo direto de mais de R$100 milhões.
De acordo com o CEO da Salvus, Maristone Gomes, a inspiração do projeto veio de experiências pessoais relacionadas à dificuldade na gestão de dados de saúde dos seus familiares. “Desenvolvemos a solução para evitar a perda de informações, gerar maior eficiência na gestão dos pacientes, e, ao mesmo tempo, evitar eventuais prejuízos financeiros às instituições de saúde”, afirma.
O primeiro lote com mais de mil unidades produzidos com essa tecnologia será distribuído e validado entre a Saúde Residência, uma das referências no atendimento em sistema home care no Recife, que é a parceira demandante do projeto, e outras unidades de saúde (home care e hospitais) no Recife e em São Paulo.
Após um período de testes com pacientes reais, o projeto prevê a emissão de um relatório público por meio de uma empresa avaliadora que analisará aspectos técnicos e de custo-benefício da solução.